sábado, 9 de março de 2019

Reflexões pós Dia Internacional da Mulher


Ontem a comunicação social falou amplamente no Dia Internacional da Mulher e no tema sempre tão presente da violência doméstica. Tive a oportunidade de ler nas redes sociais alguns comentários que me deixaram com a estranha sensação de que muitas pessoas não sabem o porquê da existência deste dia. Não estou a referir-me aos factos históricos que infelizmente fizeram com que o dia 8 de Março se tenha tornado o Dia Internacional da Mulher, mas sim às causas por detrás dos factos que levaram a esse dia, que são a desigualdade de direitos entre homens e mulheres.

O meu objetivo com este texto não é o de divagar sobre essas desigualdades, pois além destas serem de conhecimento geral, existem já muitos materiais sobre esse assunto. Pretendo apenas lembrar que o Dia Internacional da Mulher não é tanto uma celebração da mulher na sua condição – caso fosse, deveria existir também um Dia Internacional do Homem –, mas um dia para relembrar que os direitos entre homens e mulheres ainda não são os mesmos, talvez, principalmente, porque a sociedade no seu conjunto ainda não tenha evoluído o suficiente para perceber que homens e mulheres são diferentes, mas iguais.

A mentalidade é o mais difícil de mudar. E as nossas raízes familiares têm aí um papel muito importante, apesar de nem sempre definidor. Venho de uma família em que as mulheres sempre foram bem tratadas. Tanto o meu pai, como os meus dois avôs, e mesmo os meus quatro bisavôs, segundo me foi contado, tratavam as suas mulheres como iguais. Quero dizer com isto que, a nível familiar, nunca notei nenhuma diferença de tratamento, no respeito, ou na percepção do meu valor pessoal pelo facto de ser mulher. Pelo contrário, por exemplo, sempre senti que o meu pai esperava tanto de mim que me fazia sentir que não era o suficiente, que podia sempre ser e fazer melhor. Agora que já não o tenho, vejo cada vez mais que o facto do meu pai esperar sempre cada mais e melhor de mim significava que não havia para ele qualquer diferença ligada ao meu género: para ele eu tinha plenas capacidades enquanto mulher, de ser o melhor que eu puder ser e ultrapassar os meus próprios limites, porque as nossas capacidades têm a ver com a nossa humanidade, não com o nosso género. 

Por esse motivo, só a partir de certa altura na minha adolescência me apercebi de que a experiência de muitas mulheres à minha volta, e pelo mundo, era bem outra. E esse facto foi incompreensível para mim – ainda o é. Sabemos que há razões físicas e fisiológicas, históricas e psicológicas que ajudam a explicar as causas que estão na origem desta percepção e diferença de tratamento. Mas que motivos levam a que, ainda hoje existam tantos homens e mulheres – mulheres, sim - que acreditam que as mulheres são inferiores? Os motivos são demasiado complexos para aqui serem abordados, mas permitam-me dizer algo a este respeito.

Quando falamos de homens e mulheres, falamos da humanidade. Falamos de seres humanos, seres humanos que têm géneros diferentes, o que nos permite continuarmos enquanto espécie. Sem uns, não existiriam os outros, pelo que diferenças de valoração não fazem sentido. Se uma mulher e um homem trabalham durante o mesmo tempo e realizam o mesmo trabalho, o pagamento pelo seu trabalho deverá ser igual. Qualquer pessoa com capacidades de raciocínio básicas deverá concluir isso como algo lógico, acredito. 

E na esfera das relações pessoais, há algo de essencial a lembrar: cada ser humano, independentemente do seu género, é livre de fazer as suas próprias escolhas. Um relacionamento, mesmo um casamento, não é um contrato de posse – foi em tempos, já não é – e quando acaba, acaba. Um ser humano que precisa de fazer mal a outro para lidar com a dor da sua perda, e a dor de perceber que “ninguém é de ninguém”, é uma pessoa fraca e incapaz, pois não consegue aceitar que o seu poder pessoal não se mede pelo poder que tem sobre os outros, mas pelo poder que tem sobre si próprio e de realizar plenamente as suas capacidades pessoais. Que chegue o dia em que o Dia Internacional da Mulher não seja mais necessário, porque esse será o dia em percebemos finalmente que somos diferentes, mas somos iguais.

Vera Vieira da Silva

domingo, 11 de março de 2018

A Busca do Silêncio

Pico, Açores | Julho de 1992

Quando tinha 9 anos, numa viagem aos Açores, tentei subir o Pico com o meu pai. Não chegámos ao cume, mas a experiência que tive com o "Silêncio" e o que esta me ensinou marcaram-me para sempre.

Os vulcões fascinaram-me desde muito pequena. Numa altura em que devorava informação sobre vulcanologia, uma viagem até aos Açores, nomeadamente com a perspectiva de uma visita ao Pico, deixou-me muito entusiasmada. Por isso não me importei nada de acordar de madrugada naquele dia, para começar a longa subida até ao cume do Pico. Depois de tantos anos as memórias vão-se esbatendo, mas lembro-me claramente da vontade e da curiosidade que sentia, como se aquela caminhada fosse algo de mágico.

A caminho, lembro-me das diferentes cores da lava solidificada à superfície e misturadas com o verde das ervas, dos antigos canais de lava perfeitamente desenhados - alguns de dimensões consideráveis - e expostos pelo tempo, com fracturas que permitiam ver o seu interior. Lembro-me ainda de um buraco imenso - talvez um enorme canal de lava - de tal profundidade que as pedras que atirámos para dentro dele nunca mais se ouviram, como se o buraco não tivesse fundo. Estas experiências foram ainda mais impressionantes do que esperava, mas o que realmente me marcou foi o silêncio que ouvi naquele lugar.

O silêncio que ouvi no Pico não foi um silêncio qualquer, nem uma mera ausência de sons. Nunca deixei de ouvir o zumbido de insectos, as vaquinhas que mugiam ao longe ou o ocasional soprar do vento. O silêncio de que falo é um silêncio descritível, mas inexplicável. Lembro-me de o descrever aos meus pais como um silêncio que fazia "barulho". Era como um som sem som, que vibrava nos meus ouvidos e no meu corpo e que co-existia com os sons da natureza, apesar de distinto destes. Muitas vezes identificamos o silêncio com um vazio, mas este som era "cheio", quase palpável. Um som que era uma presença e não uma ausência. Apesar da minha tenra idade na altura, senti aquela experiência no Pico como algo de misterioso e espiritual. 

Aquele silêncio do Pico marcou-me de tal maneira, que mesmo passados cerca de 25 anos, lembro-me regularmente dele e falo com frequência nesta experiência a outras pessoas. É um silêncio que busco constantemente noutros lugares. O mais próximo deste silêncio é o que sinto quando estou no meio da natureza, admirando a sua perfeição, ou por vezes quando estou em silêncio comigo mesma.

A experiência que tive nos Açores tornou-se para mim uma espécie de símbolo de um "Silêncio" que quase todos procuramos, que não é a ausência de som mas sim a procura de um sentido e de uma pertença a algo muito maior que nós mesmos, um Mistério que não compreendemos, e que reside dentro e fora de nós. Que possamos todos aprender a ouvir essa voz do Silêncio. 

sexta-feira, 2 de março de 2018

Templo de Palavras

Com alegria informo que no próximo dia 3 de Março, às 15h30, a Editorial Minerva vai fazer a sessão de apresentação da Antologia Poética "Templo de Palavras", nº5, que inclui quatro poemas da minha autoria. O local será a Biblioteca Municipal D. Dinis, em Odivelas. Será uma honra poder contar com a vossa presença.




segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Medo


Por vezes, somos autênticos escravos do que não dizemos, não fazemos e do que não temos coragem de ser... por medo.

Precisamos de enfrentar o nosso deserto interior - os nossos medos - para descobrirmos que a solidão que tanto temíamos afinal não nos faz sentir sozinhos e que o deserto interior pode ser um vale fértil, um oásis, pode ser o que quisermos - e a paz que essa descoberta origina, vem do facto de sabermos que não estamos a fugir de nós mesmos, nem dos nossos medos, apesar das críticas.

Seguindo a linha de pensamento de Aristóteles, que acompanha esta publicação, quando temos coragem de enfrentar os nosso medos e de nos mexermos - remexendo tudo à nossa volta - há pessoas que não vão gostar, que vão criticar-nos, por vezes simplesmente porque, ao estarmos a enfrentar os nossos medos, estamos a lembrá-las de que não estão a enfrentar os seus... afinal, somos todos os espelhos uns dos outros. 

Enquanto tivermos medos de críticas, vamos fugir, vamos esconder-nos de nós próprios, vai haver muita frustração e muitos enganos. E tudo aquilo que poderíamos trazer de positivo e útil a este mundo, vai ficar por fazer. É um desperdício tremendo, porque a Vida tem tanto mais para nos dar - e nós tanto mais para dar à Vida.


sexta-feira, 14 de outubro de 2016

A Foreigner's View on the 2016 USA Elections: Whatever you do, don't vote for Donald Trump!


I am not an American citizen, and I don't live in the United States of America, but I going to tell you what I see from where I stand, because it's unbelievable to me how someone like Donald Trump has gotten as far as becoming a candidate to the White House, a potential president of the USA. As a citizen of this world, and someone who is worried about the outcome of these elections, I feel I have a duty to say something about what is happening.

For the last couple of weeks I have read a lot about both candidates and I've watched a lot of videos - including the presidential debates - and I still can't believe someone like Donald Trump is running for president. I confess I'm frightened by the prospect of these elections because their results will affect not just the USA, but the entire world: international politics, economy, the refugee crisis, etc. Because the available information is too much, I'm just going to focus on the present, the aftermath of the second presidential debate.

A President should be someone you can look up to, someone who has vision, who tries to find sensible and intelligent solutions to complex problems, someone who is able to inspire and connect to people - from all backgrounds - not someone who thinks he is smart for avoiding taxes. And if that wasn't enough, there's that "locker room talk" (that many athletes have said is not the typical locker room conversation)... Donald Trump said he is sorry for that and excused himself by saying he has never said he is a perfect man. We'll, he is not supposed to be perfect - no one is - but he is supposed to be better that most, and possess those qualities I've mentioned above, which he lacks.

Speaking of which, a President should be someone who serves as an example, because, whether they want to or not, they turn into role models: so I ask those still thinking on voting for Trump, do you want your future president to be a person who criticizes and makes fun of people because of their nationality, religion, colour, gender, disabilities or physical appearance? You all know the specific cases I'm referring to, so I won't repeat them here. Also, Trump incites and cultivates fear - specially islamophobia - and violent behaviour, even telling his supporters to punch the protesters at his rallies because afterwards he would bail them out of jail.

Also, although Donald Trump said he was sorry for his disgusting and sickening comments about kissing and touching women without their consent, he dismissed them as "locker room talk". Well, it's not, and that behaviour it not only low, deplorable and unrespectful - specially for a presidential candidate - it's harassment. Apologizing doesn't make it right. Is this person fit to represent your country?!

Many of his supporters defend him by stating that, unlike other politicians, he speaks from the heart: even if that was true, what is it worth, speaking from the heart, when that heart belongs to someone who lacks basic decency?

On the 8th November, remember: even if you don't particularly empathise with the other candidate, Hillary Clinton, you will not just be choosing between two candidates or political parties, you will voting for the possibility of having someone like Donald Trump as the president of the United States of America. For the good of us all, don't let that happen.



Vera Vieira da Silva

Portuguese citizen and citizen of the World





quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Chegou o Outono!

O Outono começa hoje às 15h21 no Hemisfério Norte... A precisão horária é do Observatório Astronómico de Lisboa ;)


Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta.

Fernando Pessoa in "Poesias Inéditas (1930-1935)"



sábado, 3 de setembro de 2016

Die Walküre

A despedida de Wotan da filha Brünhilde, antes de a encerrar no Fogo Mágico, numa das mais belas interpretações que já vi da música de Richard Wagner. Hildegard Behrens e James Morris são, além de maravilhosos intérpretes, excelentes actores... daqueles que nos fazem chorar quando a beleza do que nos fazem sentir já é tanta que não cabe dentro de nós e transborda... Este excerto pertence a um ciclo do "Anel do Nibelungo" considerado histórico no MET de Nova Iorque.


quinta-feira, 14 de julho de 2016

Siegfried

Desde que vi este filme há muitos anos, fiquei impressionada com a beleza e a originalidade da sua música, sobretudo a que acompanha esta cena do magnífico filme "Excalibur", de John Boorman (1981). Mais tarde descobri tratar-se da Marcha Funerária de Siegfried, personagem da tetratalogia "O Anel do Nibelungo", de Richard Wagner. De marcha funerária esta música tem muito pouco... Wagner expressa como ninguém nesta composição que os heróis como Siegfried (e o Rei Artur, neste filme), quando morrem, tornam-se imortais... se é que não o foram sempre.


Siegfried é um herói lendário da mitologia nórdica e a personagem central da Saga dos Völsunga. As primeiras representações de Siegfried e da sua lenda vieram de representações pictóricas em 7 pedras rúnicas encontradas na Suécia e de outra pedra conhecida pelo nome "Gök" (séc.XI).