O DIREITO DE SENTIR
O que sentimos é sempre válido, mesmo não tendo lógica, nem explicação. “Sentir” é um direito fundamental de todo o ser humano. Mas o respeito por esse direito - a nossa verdade emocional - tem de começar dentro de nós.
Sentimentos de alegria ou tristeza, de amor ou de ódio, de dor ou de prazer, são sempre um reflexo de algo que existe dentro de nós. Frequentemente tentamos esconder, abafar e compensar o que sentimos, e sofremos com isso… porque não admitimos a nós próprios os nossos sentimentos. Só reconhecendo-os internamente podemos trabalhá-los – sobretudo os que nos causam sofrimento – e aprender com eles.
Quando conhecemos alguém pela primeira vez, e sentimos uma ligação especial a essa pessoa, o que nos fica na memória não são geralmente temas das conversas ou pontos de vista. O que nos fica dessa pessoa é uma perceção baseada no que sentimos quando estivemos junto dela. Seja um olhar, um toque de mãos ou um carinho, o que a nossa memória retém são gestos e momentos, e o que nos fizeram sentir. Sentir é inevitável, e ainda bem, mesmo quando o sentimento é menos agradável.
Além de inevitáveis, os sentimentos não são comparáveis. O que nos dá alegria, ou nos provoca tristeza, é sempre válido e verdadeiro. Temos o direito a senti-lo, independentemente do que outros pensam a respeito. Somos diferentes, e aquilo que para uns é fácil, divertido e traz uma imensa alegria, para outros pode gerar pânico e ser profundamente perturbador. E essas são diferenças que precisamos de respeitar.
Não sabemos por que experiências as outras pessoas passaram na vida, e mesmo se soubermos, não sabemos como elas se sentiram ao vivê-las, nem como se sentem ainda. Por isso, criticar uma pessoa pelo que ela sente - ou não sente - revela insensibilidade, incapacidade de respeitar as suas características e direitos essenciais, e falta de humildade, porque presumimos saber o que é estar no lugar do outro e como o outro deveria sentir-se. Quando dizemos a alguém “sei o que estás a sentir”, estamos a tentar colocar-nos no lugar do outro, mas na realidade isso não é possível.
Além disso, quando não validamos o que outros sentem, dependendo do estado de fragilidade ou vulnerabilidade em que estes se encontram, podemos contribuir para aumentar o seu sofrimento e ainda concorrer para que o seu desequilíbrio psico-emocional. No fundo, é dizer-lhes que não têm direito de sentir o que sentem tão profundamente dentro de si, que não conseguem sentir de outra forma.
Há quem goste de ter motivos para se queixar, mas ninguém escolhe ficar triste, só porque sim. Dependendo do caso, a emoção pode ser trabalhada para que de futuro, numa situação semelhante, a perspectiva sobre ela seja diferente, e esse sentimento não regresse com a mesma intensidade. Mas no momento em que o sentimos, não há como estalar os dedos e deixar de sentir. Se racionalizar sobre o que sentimos fosse suficiente, não existiria sofrimento.
Ao tentarmos ajudar alguém a sentir-se melhor, é importante ter em conta que há um meio caminho possível entre o “excesso” de compreensão e o descaso pela verdade emocional da outra pessoa. Tentar ajudar alguém transformando-o em “coitadinho”, e demonizando outros, retira-lhe a responsabilidade de decidir o próprio caminho e até o poder de controlar o que sente, o que é claramente prejudicial e só reforça a tendência à vitimização. No extremo oposto, dizer a alguém que não devia estar a sofrer porque quem lhe provocou a dor que sente é tão infame que nem merece que sofram por sua causa, é igualmente prejudicial e inútil. Em ambas as situações, quem está a sofrer sentir-se-á pior ainda, porque ambas provocam uma sensação de impotência: no primeiro caso por “culpa” de outros, no segundo por culpa do próprio.
A questão de não devermos sofrer por alguém não faz sequer sentido. Não sofremos ou deixamos de sofrer por dever. Também não sentimos algo por merecimento ou falta dele, nem deixamos de o sentir pelo mesmo motivo. Sofremos porque estamos em crescimento, e as experiências que temos exteriormente reflectem algo no nosso interior que precisa de ser trabalhado. Quem desperta em nós um sentimento, só o desperta, não tem nada a ver com o que sentimos. O que sentimos é nosso apenas.
O lado positivo é que, se o que sentimos é nosso, só nós temos o poder de alterá-lo e não precisamos de outros para isso. Por vezes achamos que uma conversa nos ajudaria a compreender e aceitar uma experiência do passado, o porquê de alguém nos ter feito sofrer. Mas nem sempre essa pessoa está disposta a isso, e mesmo que esteja, aquilo que ela pode ter para nos dizer não é decerto aquilo que queremos ouvir. Se fosse… o passado teria sido diferente.
Continuar a achar que ainda precisamos dessa conversa que nunca chegámos a ter, só vai aumentar a nossa dependência em relação a quem despertou esse sofrimento em nós, e vai fazer com que o nosso foco continue no outro, em vez de estar em nós. Ou seja, em vez de reconhecermos e assumirmos a nossa autoridade para realizar as mudanças necessárias ao nosso bem-estar, estamos a colocar esse poder nas mãos do outro.
Para deixarmos de sofrer e voltarmos a vibrar de alegria e entusiasmo pela Vida, temos de querer. Forçar-nos seja ao que for causa desgaste, frustração e é certamente ineficaz - porque não corresponde à nossa verdade emocional. Tem de haver dentro de nós uma vontade profunda de não sentir mais do mesmo, e de nos desligarmos das experiências que ainda nos fazem sofrer. Só escolhendo não continuar a alimentar essas emoções, retirando a nossa energia e foco dessas experiências, podemos deixar de sofrer.
Precisamos também de ser disciplinados e aprender aos poucos a controlar o nosso emocional, para que de cada vez que começarmos a repetir os antigos padrões, relembrarmos o nosso objetivo e focarmo-nos novamente no caminho…
E o caminho é sempre para a frente.
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